Tolkien e a Herança Viking

Tradução e adaptação: Equipe Mare Nostrum

Sophie Hinger em sua tese de doutoramento, pela Universidade de Viena (2014), intitulada: "Tolkien and the Viking Heritage" expõe para nós diversas perspectivas acerca da utilização de elementos da cultura Viking dentro da obra de J.R.R. Tolkien, O Senhor dos Anéis. Hinger analisa como Tolkien busca na mitologia nórdica, assim como os costumes sociais e a arqueologia como fonte de inspiração para a criação da mitologia única encontrada nos escritos do autor e também como esses mesmos aspectos foram incorporados nas adaptações da obra para o cinema. Segue abaixo a tradução do resumo e introdução da tese, assim como a mesma para leitura completa do texto no original.

Resumo: Esta tese analisa diferentes aspectos da cultura Viking e sua influência sobre O Senhor dos Anéis, livros e filmes. A primeira parte argumenta que Tolkien foi profundamente inspirado pela mitologia nórdica, em termos de personagens e enredo. Estabelecemos paralelos entre a poesia e a lenda dos Vikings e os poemas de O Senhor dos Anéis, e entre a tradição oral dos Vikings e a de Rohirrim. A segunda parte compara aspectos históricos, tais como eventos históricos, línguas e runas, dos Vikings aos de culturas em O Senhor dos Anéis, especialmente a cultura de Rohirrim. A terceira parte analisa o sistema social dos Vikings e o compara com sociedades em O Senhor dos Anéis, especialmente em relação ao papel das mulheres e de Moot. A quarta parte trata de achados arqueológicos Vikings e seu reflexo em O Senhor dos Anéis. O costumes de sepultamento, habitação e armamento dos Vikings são comparados com os dos Rohirrim. Uma atenção especial é dada aos cenários e figurinos da adaptação para o cinema.
Conclui-se que Tolkien e Jackson conseguiram criar um mundo de fantasia plausível e convincente, tomando inspiração de culturas reais. As referências sutis para com os Vikings e outras tribos germânicas evocam uma imagem de uma sociedade como as do norte da Europa. Os Rohirrim não são vikings ou anglo-saxões, mas uma nova raça que se distingue de outras sociedades na Terra-Média por causa de sua característica do norte.

Introdução: The Oxford Companion to English Literature chama J.R.R. Tolkien de "a maior influência dentro do gênero de fantasia". O Senhor dos Anéis pode ser visto como o primeiro romance de fantasia épica e como a pedra fundamental para a literatura fantástica moderna. Muitos romances de fantasia o seguiram, mas O Senhor dos Anéis ainda é único e diferente dos seus sucessores. A razão para a sua singularidade é o desejo de Tolkien para criar uma mitologia em vez de uma fantasia. Ele queria escrever uma mitologia para a Inglaterra e, portanto, criou a Terra-Média como uma versão mitológica da Europa ao invés de criar um mundo novo e separado, como muitos autores de fantasia fizeram depois dele. Por esta razão, ele teve que criar um mundo o mais realistta possível e semelhante às culturas que tiveram uma rica tradição mitológica.

Duas culturas que preencheram estes requisitos são as culturas dos anglo-saxões e dos vikings, sendo ambos os povos, germânicos. Os anglo-saxões são uma parte importante da história inglesa, enquanto a cultura viking tem amplamente influenciado a cultura norte europeia e sua história. A mitologia nórdica ainda é fascinante para muitas pessoas hoje. Muito já foi escrito sobre a influência da mitologia nórdica em O Senhor dos Anéis. Porém, poucas pesquisas tem sido feitas até agora sobre como outros aspectos da cultura e da história dos vikings e anglo-saxões influenciaram a escrita de Tolkien. Esta tese vai dar um passo nessa direção. A influência germânica é mais proeminente na representação do povo de Rohan. Até agora, alguns estudiosos compararam como 'anglo saxões a cavalo'. Há, no entanto, várias semelhanças entre os Rohirrim e os Vikings que suportam a hipótese de que a cultura Viking também desempenhou um papel importante na criação do povo de Rohan. Essas semelhanças podem, por exemplo, ser encontradas em costumes funerários, a representação das mulheres e dos acontecimentos históricos. A cultura germânica e, especialmente, Viking, tem influência sobre O Senhor dos Anéis, no entanto, não se restringe apenas ao povo de Rohan. Ela também pode ser vista no tratamento geral da mitologia e poesia e em paralelos entre alguns personagens de sagas nórdicas e O Senhor dos Anéis, como por exemplo Odin e Gandalf.

As adaptações cinematográficas de Peter Jackson de O Senhor dos Anéis em 2001, 2002, e 2003 foram um sucesso mundial. Como o romance de Tolkien difere de outros romances de fantasia, os filmes de Jackson diferem de outros filmes do gênero. Jackson e sua equipe técnica várias vezes manifestaram o desejo de fazer filmes historicamente realistas ao invés de filmes de pura fantasia. Jackson "queria Terra-média como sendo algo o mais realista possível "(SdA II Anhänge, Disco 3, "Terra-média Projecção", 00:10:. 16ff), e Andrew Lesnie, Diretor de Fotografia, disse que os criadores dos filmes "Queriam tudo para que fossem sentido como se fosse real e crível e toda a história como uma pré-história do que existe na mitologia humana no momento" (SdA II Anhänge, Disco 3, "Terra-média Projecção", 00:02:. 45ff). Para conseguir este efeito ambos escritores e designers conceituais tentaram ficar o mais próximo possível da descrição de Tolkien sobre pessoas e lugares (Sibley 15), embora as histórias nos filmes diferem em certa medida a partir do romance original (ver Beranek). Onde a descrição de Tolkien não era suficiente para a criação de cenários e figurinos os produtores viraram-se para a arqueologia como fonte de inspiração. Como a obra de Tolkien foi inspirada e influenciada pela cultura e e patrimônio Viking, isso também pode ser encontrado no filme adaptações. Pode ser visto mais proeminente nos designs dos sets de Rohan  e os trajes de Rohirrim.

Esta tese analisa os modos pelos quais Tolkien e Jackson utilizaram a herança Viking como uma fonte de inspiração para o seu trabalho. Será dada especial atenção à questão de saber se o seu tratamento e utilização de material Viking se diferem. A pergunta que tentarei responder ser se o uso do material da cultura Viking ajudou - a alcançar seu objetivo de criar um mundo de fantasia realista e crível. Para fazer isso, analisarei quatro aspectos da cultura Viking e sua reflexão nas obras de J.R.R. Tolkien e as adaptações para o cinema por Peter Jackson. O primeiro aspecto, Mitologia e Literatura, centra-se na rica mitologia e tradição oral dos Vikings e sua influência sobre O Senhor dos Anéis. O segundo aspecto, História, traça um paralelo entre a história dos Vikings e a de O Senhor dos Anéis, incluindo a linguagem, runas e eventos históricos. O capítulo sobre o sistema social concentra-se em paralelos entre a organização política e o papel das mulheres na sociedade Viking e as sociedades representadas em O Senhor dos Anéis. O capítulo sobre Arte e Arqueologia compara a arquitetura e costumes funerários em O Senhor dos Anéis às dos Vikings e o figurinos e cenografia da adaptação para o cinema de achados arqueológicos dos Viking como casas, sepultamentos e armamentos.

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